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Milhões de mães solo enfrentam abandono, sobrecarga e barreiras judiciais no Brasil


Redação Tribuna do Planalto Por Redação Tribuna do Planalto em 11/05/2025 - 09:00

Mãe e filha e um dado alarmante: mais de 11 mulheres no Brasil criam filhos sozinhas (Foto: Freepik)

uidar, sustentar e educar os filhos sozinhas. Essa é a realidade de mais de 11 milhões de brasileiras que, na ausência do genitor, assumem integralmente a criação dos filhos, como mostra levantamento da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Além da sobrecarga emocional e financeira, essas mulheres lidam com um sistema de Justiça lento e com escassez de políticas públicas específicas.

A rotina de Cibele*, 26 anos, ilustra esse cenário. Mãe de um menino de cinco, ela sai de casa por volta das 6h e só retorna no início da noite. O pai da criança não contribui com os cuidados nem com as despesas. “É cansativo, mas tento não deixar que ele sinta esse estresse que carrego sozinha”, conta. Mesmo com a rotina puxada, Cibele se esforça para garantir ao filho momentos de lazer nos fins de semana. “É o que me dá força. Saber que, com organização, consigo oferecer isso a ele.”

Há três anos, ela busca judicialmente o reconhecimento da guarda e o pagamento de pensão alimentícia. O processo segue sem desfecho. “A justiça caminha devagar, mas as necessidades de uma criança não esperam”, desabafa.

Sistema lento e atendimento precário

Segundo Sueli Amoedo, advogada e especialista em políticas públicas para mulheres, as mães solo enfrentam entraves estruturais. “Muitas sequer conseguem iniciar uma ação judicial, seja por falta de orientação ou por ausência da Defensoria Pública em seus municípios”, explica. Coordenadora jurídica do projeto Justiceiras — que presta apoio gratuito nas áreas jurídica, psicológica e social — Sueli reforça que o desconhecimento sobre os próprios direitos é outro obstáculo.

“Muitas não sabem que, logo no início do processo, é possível solicitar alimentos provisórios, por exemplo. Essa falta de informação custa caro no dia a dia dessas famílias”, pontua. Em diversas cidades, mulheres madrugam em filas para tentar um atendimento jurídico gratuito — e ainda assim, muitas vezes voltam para casa sem sequer uma senha.

Rede de apoio informal

Diante da ausência paterna e da lentidão institucional, essas mães recorrem a outras mulheres: vizinhas, amigas ou familiares. No caso de Cibele, é sua mãe quem oferece suporte quando surgem emergências. “Ela também foi mãe solo. Quando preciso, é ela quem leva ao médico, busca na escola, cuida”, relata. Já o pai da criança raramente se dispõe a ajudar. “Sempre tem uma justificativa. Nunca é o momento certo.”

De acordo com o Censo 2022 do IBGE, o número de mulheres responsáveis por domicílios subiu de 38,7% para 49,1% entre 2010 e 2022. Em estados como Pernambuco, Maranhão e Rio de Janeiro, elas já são maioria absoluta. O país também registra crescimento no número de lares monoparentais, compostos por um adulto — geralmente a mãe — e seus filhos.

Falta de políticas específicas

Para especialistas, as respostas do poder público não acompanham a realidade das mães solo. “É urgente garantir creches e escolas de tempo integral, atendimento psicológico, acesso rápido a consultas médicas e medidas de transferência de renda voltadas para esse grupo”, defende Sueli Amoedo.

No campo jurídico, a ampliação e qualificação da assistência jurídica gratuita são indispensáveis. “Sem Defensoria Pública ou com serviços precarizados, essas mulheres acabam desistindo por cansaço e frustração. É uma abdicação dos próprios direitos e dos direitos das crianças.”

Apesar dos desafios, muitas seguem resistindo com coragem. “É uma jornada solitária, mas cheia de amor”, resume Cibele, que ainda aguarda, com esperança, uma resposta da Justiça.

*Nome fictício utilizado para preservar a identidade da entrevistada.