Um estudo internacional recente demonstrou uma associação significativa entre o consumo de alimentos ultraprocessados (AUP) e o aumento da mortalidade prematura em oito países, incluindo Brasil e Estados Unidos. A análise indicou que um acréscimo de 10% na participação desses produtos na dieta diária está correlacionado a um aumento de 3% no risco de morte por todas as causas. Nos Estados Unidos e no Reino Unido — países com os maiores índices de ingestão de AUP —, estima-se que até 14% dos óbitos prematuros (ocorridos entre 30 e 69 anos) possam ser atribuídos ao consumo excessivo desses alimentos industrializados.
Os AUP, como definidos pela classificação NOVA, são formulações industriais com aditivos químicos e pouco valor nutricional, como refrigerantes, biscoitos recheados, embutidos, salgadinhos e comidas prontas. Ao estudar a pesquisa, o médico nutrólogo e intensivista Dr. José Israel Sanchez Robles alerta que os “alimentos ultraprocessados, com seu alto teor de açúcares livres, gorduras saturadas e aditivos químicos — como corantes, conservantes, emulsificantes e realçadores de sabor, fazem mal”.
“Esses produtos impõem uma carga metabólica negativa ao organismo, favorecendo processos inflamatórios crônicos. Como consequência, há um aumento comprovado no risco de obesidade,diabetes tipo 2, hipertensão arterial e doenças cardiovasculares. A evidência reforçada pelo estudo indica que intervenções dietéticas populacionais poderiam ter um impacto direto na redução da mortalidade prematura”, explica o médico.
No Brasil, onde os ultraprocessados representam 17,4% da ingestão calórica média, 4% das mortes prematuras estão vinculadas a esses alimentos — percentual que sobe para 14% em nações como EUA, onde eles compõem mais da metade da dieta. “O cenário descrito evidencia a necessidade de políticas públicas mais rigorosas no controle do consumo de AUP. Medidas como a implementação de alertas frontais nos rótulos, restrições à publicidade dirigida ao público infantil e regulação da oferta desses produtos são estratégias fundamentais para mitigar os impactos negativos à saúde. A experiência de outros países demonstra que intervenções regulatórias bem estruturadas são eficazes na redução do consumo de alimentos de baixo valor nutricional e na promoção de escolhas alimentares mais saudáveis”, defende José Israel.
Esses alertas ganham ainda mais força com o trabalho de instituições brasileiras que há anos monitoram a saúde nutricional da população. Um exemplo é o Nupens, da USP, que desenvolveu projetos pioneiros como o Vigitel, responsável por acompanhar, desde 2003, os fatores de risco de doenças crônicas em capitais brasileiras. Em 2020, esse esforço evoluiu para o NutriNet Brasil, que já acompanha mais de 100 mil voluntários para identificar padrões alimentares e seus impactos na saúde.
Além da ameaça à saúde individual, o impacto social e econômico é imenso. Doenças crônicas exigem tratamentos prolongados, elevam os custos com saúde e reduzem a produtividade da população economicamente ativa. “Trata-se de uma questão prioritária de saúde pública, que demanda respostas rápidas e baseadas em evidências científicas para conter o avanço de doenças crônicas não transmissíveis associadas ao padrão alimentar contemporâneo”, continua o médico.
A pesquisa, que analisou dados de 240 mil pessoas, reforça a urgência de incluir a redução de AUP nas políticas públicas de saúde. “A adoção de hábitos alimentares saudáveis, em associação à prática regular de atividade física, constitui uma das estratégias mais eficazes de prevenção primária. Optar por alimentos in natura ou minimamente processados é uma medida fundamental para reduzir o risco de mortalidade precoce”, destaca José Israel, que ressalta, ainda, a importância do acompanhamento profissional: “Em caso de dúvidas, é recomendável buscar orientação de profissionais qualificados para avaliação individualizada e suporte contínuo à saúde.”