A trajetória de Benedita Cipriano Gomes, também chamada de Santa Dica, atravessa o tempo e se fortalece 120 anos após seu nascimento. Desde já, moradores e estudiosos de Lagolândia, distrito fundado por ela em Goiás, se empenham para manter viva a memória da mulher que virou símbolo de fé, resistência e política. Acima de tudo, Dica criou um povoado, enfrentou perseguições e deixou um legado que desafia o esquecimento.
Nascida em 13 de abril de 1905, na fazenda Mozondó, Benedita sobreviveu a quatro episódios de catalepsia, sendo dada como morta em todas as ocasiões. Então, o que era visto como milagre passou a alimentar relatos de curas e contatos espirituais. Ainda criança, ela começou a realizar benzimentos e conselhos guiados por vozes celestes, atraindo centenas de pessoas para o que viria a ser Lagolândia, hoje distrito de Pirenópolis.
A força da figura mística de Benedita Cipriano Gomes também alcançou o campo político. Em 1925, ela e seus seguidores foram alvo de ataque violento no episódio conhecido como o “Dia do Fogo”. Mesmo após a tentativa de extermínio, Dica sobreviveu, foi presa, mas retornou ao povoado meses depois com ainda mais influência. Em 1932, liderou um grupo durante a Revolução Constitucionalista, com o apoio de Getúlio Vargas.

Além disso, o povoado criado por ela se tornou um símbolo de solidariedade, partilha e liderança feminina. As terras eram divididas, o trabalho coletivo era incentivado e a educação passou a ser prioridade. Hoje, a escola local leva seu nome. “Ela surge com uma visão diferente, de que as mulheres não precisam estar só atrás do homem”, afirmou a sobrinha Brigitt Cipriano.
A história de Dica já virou livro, filme e documentário, mas seus seguidores ainda enfrentam resistência de setores religiosos e políticos para reconhecer oficialmente sua importância. “Você não pode falar da história de Goiás sem falar da Vó Dica”, afirma Brigitt. Por isso, o Instituto Santa Dica segue atuante, promovendo eventos, registrando memórias e reivindicando espaço na educação e na cultura.

Por fim, mesmo após sua morte em 1970, o túmulo de Dica, localizado na praça de Lagolândia, continua sendo um ponto de visitação e devoção. Seus feitos ultrapassam os limites da religiosidade e mostram como uma mulher visionária, perseguida e injustiçada, conseguiu transformar um pequeno pedaço de terra em um legado histórico para Goiás e para o Brasil.